sábado, 26 de fevereiro de 2011

A Conversão de Agostinho de Hipona

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Atualmente estou lendo "Agostinho de A a Z", e tenho gostado muito de conhecer a história e também as idéias desse grande pensador cristão.


Abaixo segue uma parte do livro, falando da conversão de Agostinho:


"Quando essas severas reflexões me fizeram emergir do íntimo e expuseram toda a minha miséria à contemplação do coração, desencadeou-se uma grande tempestade portadora de copiosa torrente de lágrimas. Para dar-lhes vazão com naturalidade, levantei-me e afastei-me de Alípio, o necessário para que sua presença não me perturbasse, pois a solidão me parecia mais apropriada ao pranto. Alípio percebeu o estado em que me encontrava: o tom da voz embargada pelas lágrimas, ao dizer-lhe alguma coisa, havia-me traído. Levantei-me; ele permaneceu atônito, onde estávamos sentados. Deixei-me, não sei como, cair debaixo de uma figueira e dei livre curso às lágrimas, que jorravam de meus olhos aos borbotões, como sacrifício agradável a ti. E muitas coisas eu te disse, não exatamente nestes termos, mas com o seguinte sentido: “E tu, Senhor, até quando? Até quando continuarás irritado? Não te lembres de nossas culpas passadas”! Sentia-me ainda preso ao passado, e por isso gritava desesperadamente: “Por quanto tempo, por quanto tempo direi ainda: amanhã, amanhã? Por que não agora? Por que não pôr fim agora à minha indignidade”? Assim falava e chorava, oprimido pela mais amarga dor do coração. Eis que, de repente, ouço uma voz vinda da casa vizinha. Parecia um menino ou menina repetindo continuamente uma canção: “Toma e lê, toma e lê”. Mudei de semblante e comecei com a máxima atenção a observar se se tratava de alguma cantilena que as crianças gostam de repetir em seus jogos. Não me lembrava, porém, de tê-la ouvido antes. Reprimi o pranto e levantei-me. A única interpretação possível, para mim, era a de uma ordem divina para abrir o livro e ler as primeiras palavras que encontrasse. Tinha ouvido que Antão, assistindo por acaso a uma leitura evangélica, sentiu um chamado, como se a passagem lida fosse pessoalmente dirigida a ele: “Vai, vende os teus bens e dá aos pobres, e terás um tesouro nos céus. Depois, vem e segue-me”. E logo, através dessa mensagem, converteu-se a ti. Apressado, voltei ao lugar onde Alípio ficara sentado, pois, ao levantar-me, havia deixado aí o livro do Apóstolo. Peguei-o, abri e li em silêncio o primeiro capítulo sobre o qual caiu o meu olhar: “Não em orgias e bebedeiras, nem na devassidão e libertinagem, nem nas rixas e ciúmes. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não procureis satisfazer os desejos da carne”. Não quis ler mais, nem era necessário. Mal terminara a leitura dessa frase, dissiparam-se em mim todas as trevas da dúvida, como se penetrasse no meu coração uma luz de certeza. Marcando a passagem com o dedo ou com outro sinal qualquer, fechei o livro e, de semblante já tranquilo, o mostrei para Alípio. Também ele, por sua vez, me mostrou o que lhe acontecera e que eu ignorava. Pediu-me que lhe mostrasse a passagem lida por mim. Mostrei-a, e ele prosseguiu além do que eu havia lido, ignorando eu portanto o que estava escrito. O texto era o seguinte: “Acolhei o fraco na fé”. Alípio aplicou-o a si mesmo e o revelou para mim. Foi como um convite que o firmou em seu propósito, perfeitamente de acordo com seu tipo de vida, que há muito tempo o havia distanciado de mim. Sem hesitar e sem se perturbar, juntou-se a mim. Fomos imediatamente à minha mãe e lhe contamos o sucedido. Ela ficou radiante. E nós lhe relatamos como os fatos se tinham desenvolvido. E ele exulta e triunfa, bendizendo-te, Senhor, “que és poderoso além do que pedimos ou pensamos”. Verificava que lhe havias concedido muito mais do que ela pedira com lágrimas e orações em meu favor. De tal forma me converteste a ti, que eu já não procurava esposa, nem esperança alguma terrena, mas permanecia firme naquela fé em que tantos anos antes me tinhas mostrado em sonho a minha mãe. “Transformaste sua tristeza em alegria”. Alegria muito maior do que ela havia desejado, e muito mais preciosa e pura do que ela poderia esperar dos netos nascidos da minha carne."
"Logo, aquele que dia a dia renova-se progredindo no conhecimento de Deus, na justiça e santidade da verdade (Ef 4.24), transfere seu amor do temporal para o eterno; do visível para o invisível; do carnal para o espiritual; e persiste com muito cuidado em refrear suas paixões e diminuir os desejos em relação aos bens temporais, para se unir com perseverança aos bens espirituais, pela caridade. E tanto mais caminhará, quanto mais for ajudado pela graça de Deus. Pois esta é a palavra divina: sem mim nada podeis fazer (Jo 15.5)"